Foto: Alep

Você sabia que em 29 dos 42 municípios do Sudoeste do estado, se abrir a torneira de casa e encher um copo com água, mesmo não enxergando a olho nu, essa água contém resíduos de 27 tipos diferentes de venenos usados nas lavouras da região?

Os dados são oficiais do Ministério da Saúde, com base em pesquisas feitas junto a instituições dos meios acadêmico, da área da saúde e ambiental.

Isso acontece porque as lavouras do Sudoeste do Paraná, especialmente as de soja, milho e trigo, consomem ano a ano mais de 9 mil toneladas de agrotóxicos. O resíduo de todo esse veneno depositado no solo é que acaba voltando para as torneiras e vai parar no copo de água, no balde da limpeza da casa, na louça, no banho e na higiene da família sudoestina.

Aliás, a mesma pesquisa foi realizada em 1.396 municípios por todo o Brasil e só identificou os 27 tipos diferentes de venenos porque são só esses que são obrigados por lei e que são submetidos a testes.

Em outras palavras, foram encontrados na água potável consumida no Sudoeste do Paraná TODOS os tipos investigados para fins de monitorar a qualidade da água consumida e perceber os efeitos que causam na saúde da população.

Aqui no nosso estado, 82% dos municípios estão nessa mesma situação de risco. São 326 cidades em que os componentes do veneno das lavouras retornam na pia da cozinha, no tanque ou no chuveiro, como em Francisco Beltrão, por exemplo.

Desses 27 venenos, 16 são considerados altamente tóxicos e 11 dessas substâncias estão diretamente associadas à incidência de doenças crônicas, como o câncer, a má formação dos bebês, disfunções hormonais ou problemas reprodutivos.

Infelizmente, o problema tende a ser muito maior já que esse estudo foi feito entre 2014 e 2017.

Em 2021 no Brasil, 720 mil toneladas de veneno agrícola foram vendidas para utilização nas plantações. No governo Bolsonaro, de 2018 até o mês de novembro de 2022, mais de 2 mil novos herbicidas e pesticidas foram liberados para venda no Brasil, e mais: 30% destes de agrotóxicos são proibidos nos países da União Europeia e 20% registrados com a classificação de “extremamente”, “altamente” e “medianamente” tóxicos para a saúde humana.

Mas você pode dizer: “Ah, que exagero criticar os produtos que matam os bichos que atacam as lavouras, diminuem doenças das plantas e fazem o país produzir em maior quantidade para combater a fome!” Ou podem achar também que o veneno diluído na água da torneira, não seja causador de doenças na população.

Será mesmo?

Eu até gostaria de trazer aqui informações mais animadora, mas… A consequência desse envenenamento todo é a alta existência de problemas graves, na vida da nossa gente. Tanto de quem trabalha e manipula diretamente o veneno no campo quanto de quem consome a água e os alimentos envenenados.

Segundo indicadores do banco de dados do Sistema Único de Saúde (o DATASUS), foram registrados, em 2019, mais de 8.400 intoxicações por agrotóxicos no Brasil e houve um aumento de 109% dessas ocorrências no período de 9 anos, entre 2010 e 2019. O mais triste é que quase 10 mil intoxicações nesse mesmo período aconteceram em crianças de 0 a 14 anos, resultando em 91 mortes.

Está cientificamente comprovado ainda por estudos dessa mesma natureza, feitos por meio de pesquisas acadêmicas e de institutos que fazem a investigação para o tratamento de doenças, que os resíduos de agrotóxicos podem ser encontrados também na urina das pessoas que trabalham com a manipulação dos venenos agrícolas e no leite materno das mulheres expostas a esse contato.

É aí que a nossa preocupação recai de novo no Sudoeste do Paraná, uma vez que pesquisas realizadas pelo Hospital do Câncer de Francisco Beltrão (Ceonc), em parceria com universidades e com o Instituto Nacional do Câncer (INCA) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), demonstraram que 1 em cada 3 agricultoras sudoestinas tem chance de desenvolver tipos mais agressivos de câncer de mama por causa da exposição aos agrotóxicos no trabalho da lavoura. Não tem quem não conheça alguma família ou alguém na região que tenha vivido esse drama ou perdido parente, pessoa conhecida ou amiga para a doença.

Esse estudo apontou que os 27 municípios da 8ª Regional de Saúde do Paraná têm 41,4% mais casos de câncer de mama que o restante do País e, por esse motivo, apresentam também uma mortalidade 14% maior que a nacional e 17% acima da taxa de mortalidade por câncer de mama do Paraná.

A exposição das nossas agricultoras aos pesticidas, fungicidas e herbicidas usados nas plantações é a principal causa delas terem 32% mais chance de desenvolverem câncer de mama que mulheres que não trabalham na roça e nem manipulam ou têm contato direto com esses venenos. A contaminação dos agrotóxicos nas trabalhadoras rurais se dá pela pele e até na lavagem de roupas ou de objetos usados na lavoura.

Você não acha que governo do estado precisa fazer alguma coisa?

Essa situação me preocupa muito e por isso, propus diversos projetos para a criação de leis que resultem na redução do uso de agrotóxicos, que incentivem, valorizem e apoiem os agricultores a saírem da produção convencional e para que invistam e se dediquem à produção de alimentos orgânicos, agroecológicos, livres de veneno.

Uma das minhas ideias, junto com outros colegas deputados, foi a iniciativa de criar uma lei para garantir a merenda escolar 100% orgânica nas mais de 2 mil escolas da rede pública estadual do Paraná. Isso é para acontecer, de forma gradativa, até o ano de 2030.

Mas para chegarmos em 2030 com todas as escolas abastecidas da merenda 100% orgânica e comprada diretamente da agricultura familiar, o governo do estado tem que ajudar. Por isso solicitei ao governo uma série de medidas para estimular a organização da produção, conscientizar a população e para dar segurança aos produtores de que essa compra governamental vai acontecer de fato e que isso é um bom negócio também para eles se manterem e para gerar trabalho e renda no interior do estado.

Senão, não tem como competir com o canto da sereia dos agrotóxicos!

Ah! E eu não paro por aí não, tenho conversado com o governo e buscado influenciar o orçamento do estado para garantir que as universidades estaduais possam desenvolver e ampliar as pesquisas voltadas à prevenção e ao tratamento do câncer. Eu quero que esses números e essa triste realidade mudem. As pesquisas não servem só para mostrar o caos e nem para abater o ânimo de ninguém, mas para jogar luz sobre os problemas que o Poder Público tem por dever resolver e evitar para assegurar vida plena e digna à população.

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