Mesmo que não fizessem mal a saúde, mesmo que não transgredissem a lei, mesmo que não interferissem no curso natural da vida, mesmo que diminuíssem custos de produção, ainda assim teria um grande motivo para lutar contra a liberalização dos produtos transgênicos. O motivo se chama independência.
Nossa agricultura familiar, já refém da burocracia do crédito, da política de preços, da ausência de uma tecnologia alternativa, do custo dos insumos e de um processo de profissionalização de ponta, será transformado em objeto de exploração permanente e legalizado nas mãos de empresas dominadoras de tecnologias de modificação genética.
Haverá um processo de empobrecimento não só econômico, mas também cultural, pois as novas gerações de produtores familiares não dominarão mais o círculo de produção agrícola. O domínio estará nas mãos de poucos e bem pagos técnicos de grandes empresas, e nossos agricultores saberão apenas pagar Royalties. Haverá uma grande fragilização sócio-econômica das famílias e comunidades rurais, promovendo um empobrecimento histórico no meio rural e uma grande transferência de conhecimento e riqueza para as mãos de empresas multinacionais do porte da Monsanto.
Sei e conheço os “fortes” argumentos dos defensores da liberação: Diminuição do uso de agrotóxicos, aumento da produção e conseqüente diminuição da fome, ou então que a modificação genética é um caminho sem volta, pois representa a modernidade. São fortes, mas não deixam de ser relativos. A fome é muito mais conseqüência da má distribuição e da concentração do que por falta de produção de alimentos. A propaganda da diminuição do uso de agrotóxicos esconde o forte monopólio que as próprias empresas de modificação genética possuem sobre a pesquisa e uso de insumos. E se falarmos em modernidade, teremos que lembrar necessariamente que a urbanização e a automação são defendidas como avanços, mas que estão deixando um legado de desemprego, marginalidade e de queda dos níveis de qualidade de vida.
Sei que o debate entre os prós e contra a liberação é salutar e enriquece culturalmente nossa sociedade. Promove estudos universitários, provoca as instituições para a tomada de posição e faz os organismos públicos refletirem e estudarem profundamente qualquer decisão a ser tomada. E uma decisão para ser tomada é sempre precedida de muito estudo e consulta; de avaliação dos efeitos imediatos e da conseqüência histórica para nossa sociedade.
Tenho clareza também que os argumentos usados hoje para defender uma idéia podem se tornar obsoletos com o tempo. A história pode derrotar qualquer argumento, mas a minha concepção de vida, o aprendizado político, e as experiências de espoliação vistas por este mundo afora, constituem a base da minha argumentação contrária à liberação dos transgênicos.
Não me assusto com a possibilidade de ser vencida nos argumentos, o que me assustaria seria ver uma sociedade passando à margem dos grandes debates contemporâneos, muitos deles impostos pelos interesses de grupos econômicos a serviço do imperialismo.
A luta contra os transgênicos é uma luta de resistência. E quem resiste não tem obrigação de apresentar alternativas, pois a alternativa que resta é resistir para existir.
Autor: Deputada Luciana Rafagnin